Sinédoque de historiografia romântica


Com o Romantismo reduziu-se a literatura ao que era antes a poesia (lírica e narrativa), mais o teatro. Podia, pois, pensar-se que já não fazia sentido a mentalidade clássica e, por consequência, estaríamos a perder tempo comentando historiadores. Porém o Romantismo ainda cultivou a História como género literário superior e desse culto participaram escritores portugueses importantes para os nossos, entre eles se destacando Alexandre Herculano. O culto era também, como na antiguidade greco-latina, um culto estético.

A historiografia de Oliveira Martins, muitos anos depois e já quando o Romantismo vinha sendo substituído por outras escolas literárias e de pensamento, é reconhecida pelo seu valor artístico, pese embora a parcialidade, o preconceito, o racismo e a deselegância de estilo com que julga, avalia e condena até os colonizados – povos que não podiam nem exprimir-se nem desenvolver-se livremente. Pese embora isso tudo, Oliveira Martins tem preocupações de escritor quando elabora a sua História de Portugal, ou a da civilização ibérica. Repare-se, não só na escrita viva, entusiasmada muitas vezes, mas também nas narrativas inseridas nelas, no vigor dos retratos psicológicos dos protagonistas, até no exagero com que pinta os heróis, fugindo à regra crítica exposta, com todo o zelo e razão, pelo Cardeal Saraiva. Isto não se passou apenas em Portugal. Algumas das obras comentadas nesta secção caracterizam-se também estilisticamente, ora vibrantes, ora apaixonadas, ora de outro cariz por igual articulado a preocupações estilísticas. Portanto, a História mantinha-se, durante o século XIX, ao mesmo tempo uma disciplina que se queria científica (mas ainda facilmente escorregava para o panegírico, a exaltação, a parcialidade) e um género digno da arcaica expressão “belas letras”. Ao reservar um lugar próprio aos historiadores e suas obras, não estou somente a respeitar a importância que tiveram no mercado livreiro do Recife, ou nos espólios românticos de Angola. Tenho como pressuposto que estamos a estudar um género literário, tido por tal ao tempo. Penso que mesmo J. A. de Carvalho e Menezes escrevia conservando-se fiel a uma tal noção de História.



Ler as secções deste capítulo para detalhar:

  1. Histórias de tempos antigos, antropologias
  2. Tempos menos antigos



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